Conclusões

A 3ª edição do PCEEE – Portugal em Conferência por uma Economia Energeticamente Eficiente decorreu no passado dia 20 de Junho de 2014, na Fundação Calouste Gulbenkian. O tema deste ano foi a “Eficiência Energética como fator de competitividade”, tendo, mais uma vez, sido atingido o objetivo de possibilitar o intercâmbio de informação entre os vários promotores da eficiência energética em Portugal, nomeadamente investigadores, órgãos da administração central ou local, organizações não governamentais, agências de energia, empresas e outros.
O PCEEE é promovido pela Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, pelo CENSE- Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade da FCT-UNL, pelo ISR – Instituto de Sistemas e Robótica da Universidade de Coimbra e pelo CESUR – Centro de Sistemas Urbanos e Regionais do IST-UL.
No sentido de contribuir para ao avanço do debate científico, político e cívico em torno do tema da eficiência energética (EE), este documento procura sumariar as principais conclusões do evento. As conclusões são apresentadas por sessão.

Sessão de abertura e sessão plenária

- O discurso público sobre EE coloca a tónica na enorme relevância que esta tem para a competitividade, mas as ações continuam a não acompanhar a centralidade que é dada ao conceito em termos discursivos. Esta discrepância observa-se não apenas ao nível das medidas políticas, mas também ao nível do investimento realizado e dos apoios disponibilizados.

- Até hoje, não existe um grupo de interesse formal que defenda a perspetiva da eficiência energética, ao contrário do que acontece nas restantes áreas do setor da energia, o que poderá justificar, em parte, a discrepância que se observa entre o discurso da centralidade da EE e a prática.

- É cada vez mais evidente que o peso do uso de recursos nos custos das empresas é mais significativo e oneroso do que os custos do trabalho, o que pode representar uma oportunidade para a concretização da EE, particularmente num contexto em que a agenda da União Europeia aponta para o uso eficiente de recursos como um dos elementos fundamentais da sua estratégia de desenvolvimento, inovação e competitividade. A este nível, o facto da EE contribuir de forma clara para a redução de gases com efeito de estufa, reforça ainda mais o interesse de que este tema se reveste para o futuro.

- O exemplo do Estado assume grande relevância e os seus benefícios deverão ser maximizados, não apenas através do investimento na concretização de soluções, mas também criando as condições de mercado para o desenvolvimento das empresas de serviços de energia ou estruturando um enquadramento fiscal (fiscalidade verde) que promova a aposta na EE, por parte dos particulares e das empresas.

- A área da mobilidade mantém-se como um dos desafios mais relevantes. Recentemente observaram-se algumas alterações no sentido do menor consumo de combustíveis rodoviários, mas é impossível saber (nesta como noutras áreas do uso da energia em que se observaram reduções em anos mais recentes) se estamos perante alterações estruturais ou meramente conjunturais.

- A premência do tema da EE é particularmente clara quando se observam as projeções globais de uso de energia nas próximas décadas, onde se observa, quase sem exceção, um aumento contínuo das necessidades energéticas. Este facto, a par com a constatação que, a nível global, nos últimos 10 anos não se observou uma diminuição da intensidade carbónica, parecem deixar entrever que os constrangimentos que o problema das alterações climáticas levanta à área da energia não foram convenientemente internalizados nas políticas e nas ações de governos, empresas e cidadãos.

- Quando se trabalha o tema da EE especificamente é importante fazer uma análise crítica da forma como as políticas têm vindo a ser desenvolvidas e os seus efeitos no uso de energia, nomeadamente, considerando a possibilidade de estabelecer tetos máximos de consumo, independentemente da dimensão ou do luxo dos equipamentos – progressive efficiency – uma abordagem que procura integrar critérios de equidade e sustentabilidade. É também muito importante integrar as condições reais de uso quando se procura aferir a eficiência de um equipamento, pois só assim poderemos ter uma perspetiva da eficiência efetiva.

- Para além da componente tecnológica, é fundamental fomentar um maior conhecimento sobre os usos da energia de forma desagregada e compreender como estes se ligam com os ritmos da vida social. Várias medidas apontam para a necessidade de alterar consumos ao longo do dia, retirando-os da hora de pico para outros períodos, mas pouco se sabe sobre até que ponto será possível a dessincronização das práticas sociais que estão subjacentes a esses usos da energia. Até que ponto os ritmos da sociedade são flexíveis? Como é que evoluirá o uso da energia nas próximas décadas (se pensarmos na forma como evoluiu nas últimas décadas, será credível prever como a evolução ocorrerá até 2050)? Todas estas questões devem estar presentes quando se planeiam intervenções (tecnológicas ou políticas). O uso da energia está intricadamente ligado à cultura e às práticas e é pouco eficaz pensar o primeiro sem conhecer aprofundadamente as segundas.

Sessões temáticas em paralelo

Painel 1 – Inovação tecnológica na eficiência energética (edifícios)

- A aposta na componente estrutural dos edifícios continua a surgir como uma das estratégias mais eficazes para promover a EE, desde logo pelo papel de facilitador da ação individual. O investimento na reabilitação de edifícios mantém-se, assim, como um fator chave para melhorar o desempenho energético dos edifícios.

- Revela-se necessário fazer um trabalho mais aprofundado sobre a energia incorporada nos materiais de construção, de forma a permitir um balanço mais aproximado do ciclo de vida do edifício.

- É importante integrar inovação, mas esta não tem necessariamente que assentar em novas tecnologias ou materiais, valendo a pena revisitar os saberes/conhecimentos tradicionais na área da construção de edifícios e procurar perceber de que forma podem ser utilizados em prol da EE.

- No balanço energético de um edifício há diversas dimensões a ter em conta, sendo muito importante não descurar os equipamentos eficientes.

Painel 1 – Inovação tecnológica na eficiência energética (mobilidade)

- O setor dos transportes mantém-se como um dos grandes desafios, sendo muito importante trabalhar ao nível da procura e da eficiência tecnológica das soluções.

- Os veículos elétricos têm um espaço a ocupar no âmbito da mobilidade sustentável sendo importante criar as condições para o seu desenvolvimento, nomeadamente ao nível de:
• Custo de aquisição inicial;
• Gestão da autonomia/carregamento como fator crítico para a competitividade da solução.

- A formação contínua sobre os hábitos de condução, particularmente entre os profissionais do transporte rodoviário (passageiros e mercadorias), pode desempenhar um papel relevante no aumento da EE no setor.

- Os biocombustíveis resultantes do aproveitamento dos óleos alimentares usados têm potencial de substituição dos combustíveis rodoviários comuns, mas existem barreiras ligadas à organização do sistema de recolha e transformação que têm que ser ultrapassadas.

- As estratégias mais alargadas de utilização de biocombustíveis têm que ser seguidas com cuidado e tendo sempre por referência a sustentabilidade das matérias-primas e dos processos privilegiados. Também a este nível a inovação deve andar a par com a sustentabilidade.

Painel 2 – Inovação social no uso sustentável da energia

- Compreender a questão da procura da energia revela-se fundamental para estruturar políticas na área da EE.

- É fundamental desenvolver estratégias de comunicação dirigidas a diferentes utilizadores de energia e ir para além da mera informação ou sensibilização. Avançar para serviços de esclarecimento/aconselhamento que respondam às necessidades concretas de cada utilizador pode ser um elemento despoletador de maior intervenção nesta área.

- Observa-se uma ligação entre os estilos de vida e o consumo da energia, sendo que a ação dos jovens em termos de uso eficiente de energia tende a ser menos proactiva do que noutras áreas do ambiente como a dos resíduos.

- Ao nível da construção social da normalidade dos usos de energia verifica-se que a imagem associada às tecnologias utilizadoras de energia e os próprios usos da energia tendem a ser de normalidade e de algo expectável, sempre numa ótica positiva. Quando se verificam situações de ausência de energia, a imagem transmitida tende a ser a de pobreza, sofrimento e insegurança, apontando para uma perspetiva negativa. Assim, o uso da energia é visto como propiciador de bem-estar, de modernidade e de conforto e qualquer restrição ao mesmo como um indicador da situação oposta.

Painel 3 – Instrumentos para a promoção da eficiência energética

- Observou-se a apresentação de exemplos de intervenções em instituições de diferentes naturezas e de grande dimensão, o que parece indicar que a integração da EE na gestão quotidiana de instituições como universidade, instituições hospitalares, empresas, municípios começa a ser mais frequente.

- Reconhecendo a importância de conhecer para intervir, esta tendência revela uma enorme capacidade de sensibilização dos decisores para a necessidade e a potencialidade de investir em EE enquanto boa medida de gestão. O facto de estarmos perante instituições com grande visibilidade social pode e deve ser um catalisador para mudanças mais abrangentes na sociedade portuguesa.

- O uso de estratégias de benchmarking surge também como uma abordagem eficaz de motivação.

Sessão de debate final

Entre as principais conclusões há a destacar a necessidade de se dar um passo em frente e passar da reflexão para a ação, ou seja, para uma maior concretização das políticas de EE. Para tal, criar instituições de interface entre quem pode financiar e quem está interessado em fazer investimentos em eficiência energética poderá representar um passo em frente, particularmente se estivermos perante instituições sem fins lucrativos, com um forte capital de confiança e um perfil de independência e idoneidade.

O benchmarking como fator de motivação para a melhoria contínua em termos de eficiência energética surgiu como outro elemento chave, ao promover a comparação entre diferentes desempenhos. Esta pode ser uma ferramenta importante para um maior investimento em eficiência energética, particularmente se associada a práticas de transparência e de divulgação pública dos resultados.

Mais uma vez ficou demonstrado que a área dos comportamentos é crítica. Alguns resultados apontam para uma menor sensibilização dos jovens para o tema (por exemplo, quando se compara com os resultados obtidos na área dos resíduos), o que espelha as lacunas de formação/sensibilização que existem. Na área da energia não houve, até hoje, nenhuma entidade com um papel semelhante ao desempenhado pela Sociedade Ponto Verde (SPV) na área dos resíduos. No caso dos resíduos, a Sociedade Ponto Verde, utilizando fundos privados, tem investido há mais de uma década em educação e sensibilização e essa aposta tem dado frutos. Na área da energia não houve, até hoje, nenhuma entidade com semelhante papel, o que acaba por se refletir no grau de sensibilização para o tema. É urgente ultrapassar esta lacuna se se pretende construir uma sociedade energeticamente eficiente.

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